O Flagrante no Estacionamento e a Teia que Prendeu um Policial do Garras

Era uma transação comum em um cenário banal: o estacionamento de um supermercado em Campo Grande, no final de novembro de 2025. A rotina do local, no entanto, foi quebrada pelo movimento que antecedeu a entrega de uma sacola. De um lado, o ex-guarda municipal Marcelo Raimundo da Silva. Do outro, o policial civil Augusto Torres Galvão Florindo, integrante da elite do Garras, a delegacia que combate os crimes mais ousados, como roubos a banco e sequestros. O conteúdo da sacola – R$ 160 mil em dinheiro vivo – era a materialização de uma denúncia anônima e o fio que levaria ao desmantelamento de um esquema criminoso com ramificações surpreendentes.

A operação da Polícia Federal, deflagrada após o recebimento da denúncia, interceptou o momento exato em que a propina mudava de mãos. O pagamento, segundo as investigações, estava ligado a atividades de contrabando e descaminho. O flagrante foi a peça inicial que desencadeou uma sequência judicial reveladora, culminando na audiência de custódia do sábado, 29 de novembro, quando a Justiça não apenas manteve os dois atrás das grades, como converteu a prisão em preventiva.

A decisão da magistrada foi contundente. Ela destacou a “atuação coordenada típica de organização criminosa”, a expressiva quantia de dinheiro apreendida e, sobretudo, a gravidade de encontrar um agente de segurança pública no centro do esquema. O risco para a ordem pública e para as investigações era alto demais para qualquer medida alternativa. A prisão preventiva foi a resposta. A Justiça também autorizou a quebra do sigilo telefônico dos investigados, na expectativa de que os celulares apreendidos contivessem os segredos que levariam ao coração da organização.

Um fato chamou a atenção, nesta prisão quando se olhou para a vida pessoal de Augusto Torres. Ele é casado com Luciana Schenk, promotora de Justiça que, por anos, esteve à frente do Gacep, o grupo do Ministério Público responsável por controlar e investigar a atividade policial no estado. Durante seu mandato, Luciana chefiou investigações sobre abusos e ilegalidades cometidas por policiais. Ela deixou o cargo em julho de 2024, e pouco mais de um ano depois, o marido era preso em flagrante recebendo dinheiro de um esquema que sua antiga equipe teria a missão de combater.

O caso reacendeu questionamentos profundos sobre os limites do controle e os possíveis conflitos éticos que podem minar as instituições. Enquanto a PF segue vasculhando os dados dos celulares e a Justiça mantém os dois presos, aguardando as próximas movimentações processuais, o silêncio das instituições é a resposta oficial até o momento. O episódio, que começou com uma sacola de dinheiro em um estacionamento, transformou-se em um emblemático drama que envolve crime, poder, e as linhas tênues que separam aqueles que juram combater a ilegalidade daqueles que a abraçam.

Nossas Redes Sociais